quarta-feira, março 24, 2010

Guia: muito mais que os olhos do atleta

Após o tiro de largada, dois corações unidos percorrem a pista em busca da vitória. A prova de para-atletismo pode ser individual, mas dois corpos cruzam a linha de chegada como um só. As quatro pernas, cansadas com o desgaste da corrida, caminham no mesmo ritmo. O cordão de 30 cm que separava o contato dos velocistas é deixado de lado. A alegria, ou a decepção, é compartilhada pela dupla, agora, no abraço, com o atrito da pele. Nas competições de atletismo para deficientes visuais, o guia é mais que os olhos do atleta: ele tem a força da palavra que pode levá-lo à vitória.

Nas provas de atletismo para deficientes visuais com perda de visão total, o guia é imprescindível. Esses atletas se encaixam na categoria esportiva B1, quando a pessoa tem ausência total de percepção da luz, ou pouca percepção, mas sem capacidade para reconhecer a forma de uma mão em qualquer distância ou sentido. Na categoria B2, com até 5% de visão, o guia é optativo. Quando o corredor tem de 10% a 15% de visão, da categoria B3, não tem direito ao orientador. Essas medições são feitas com o melhor olho da pessoa e a correção possível dele. A letra “B” vem de Blind – Cego, em inglês – segundo a Blind Sport Association.

Nas competições, o guia serve como os olhos do atleta, posicionando-o e indicando o percurso à frente. Em outras modalidades também existe a presença desse profissional. No Lançamento, o guia orienta o atleta e no Salto, corre ao lado até o local do pulo, quando dá um sinal para o para-atleta. Nas provas de velocidade, a postura e o direcionamento da pista já são orientados logo no início pelo guia. Mas é durante a prova que a presença de um parceiro se mostra fundamental, não só pela visão, mas por dar apoio psicológico ao atleta. Palavras de incentivo são essenciais e podem dar a medalha de ouro ao velocista.

Maria José Ferreira Alves, a Zezé, foi uma das primeiras atletas paraolímpicas em provas de velocidade do país. Ela disputa a categoria T12 (B2), para atletas com baixa visão. Quando começou, corria sozinha. Representantes da seleção brasileira perceberam que ela saía muito de sua raia, o que fazia perder tempo. Naquela época, Ádria dos Santos disputava essa categoria. Chegando em segundo nas competições nacionais, Zezé chamou a atenção da equipe brasileira e recebeu o convite para a seleção. Em 1996, Gerson Knittel, guia de Ádria, foi indicado para orientar Zezé. Trabalhou com as duas até 2000, quando decidiram que Knittel deveria se focar em apenas uma atleta. Nas Paraolimpíadas de Sidney, Zezé disputou com outro guia, mas não teve o mesmo rendimento de Atlanta – quatro anos antes - , quando ganhou dois bronzes. Ficou em quarto lugar. Em 2001, Knittel voltou a guiar a velocista e já nas Paraolimpíadas de Atenas – 2004 – conseguiu duas medalhas com o terceiro lugar.

Nervosismo atrapalha Zezé nas competições. Knittel serve como calmante. Segundo a velocista, durante a prova, o guia traz segurança. “Ele é positivo e transfere isso pra mim”, explica. Por essa relação, a atleta se sente confiante em correr ao lado de Knittel. “Devo tudo a ele”, diz. Segundo a atleta, o guia compartilhou o sentimento de competitividade e fez com que ela se dedicasse muito nos treinos.

Duas medalhas de ouro e uma de bronze em jogos parapan-americanos, cinco bronzes em Paraolimpíadas. Apesar dos bons resultados, Zezé se sente frustrada pela falta de reconhecimento quando não se chega em primeiro lugar. A parceria laureada não trouxe a Knittel os méritos pelo trabalho feito no esporte. A velocista se entristece por nunca ter trazido um ouro nas Paraolimpíadas, o que traria a seu guia o reconhecimento que merece. “Ele foi o primeiro a fazer esse tipo de trabalho e ninguém fala dele”, diz Zezé.

Para se tornar bom guia, não basta enxergar: é necessário ser um atleta de ponta. Segundo Everaldo Brás Lúcio, professor de Educação Física e guia da AJIDEVI, o orientador precisa estar mais preparado que o próprio para-atleta. Em um primeiro instante, ambos treinam juntos. Depois, partem para treinos individuais. “O orientador treina o dobro”, diz Lúcio. Um exemplo da qualidade nos treinamentos dos guias é a velocidade que uma pessoa tem que alcançar para correr ao lado de Lucas Prado, cego mais rápido do mundo. Seu guia Justino Barbosa percorreu, ao seu lado, os 100 metros da pista de atletismo, na Paraolimpíada de Pequim, em 11s03. Se Barbosa terminasse a corrida dos 100 metros com esse tempo nas Olimpíadas de Atenas, em 1896, seria recordista olímpico, com 0,97 segundos a menos que o tempo de Tom, que bateu o recorde naquele ano.

Prado, hoje, treina com dois guias - além de Barbosa, Laécio Alves Martins. Mais que respeito, o novo guia conquistou a confiança de Prado. “Aprendemos que juntos podemos alcançar qualquer coisa, assim como um atleta com visão”, comenta. Essa parceria trouxe uma lição para o guia: “ele me ensinou que não existem dificuldades que não possam ser superadas”. Dificuldades que Martins terá, suando a camisa e buscando preparo físico suficiente para acompanhar Prado, que projeta correr os 100 metros em 10s.

A preparação feita pelos guias não serve apenas para o trabalho paraolímpico. Lúcio diz que os guias costumam participar de provas também como atletas. “Uma coisa não impede a outra”, explica. As competições não ocorrem no mesmo momento, o que facilita a dupla jornada de preparação.

Atualmente o guia não é tratado como atleta. Não existe nenhum incentivo para esse trabalho. Segundo Lúcio, por isso, há a grande dificuldade no para-atletismo em conseguir guias. O número desses profissionais é baixo. Hoje, para-atletas recebem a “bolsa atleta” do Ministério do Esporte para continuar no esporte. Existe a possibilidade de conseguir essa ajuda financeira também para os guias, que são voluntários. “Apenas os guias de atletas de ponta recebem algo”, explica. Chocolate e Barbosa, guias de Ádria e Prado, respectivamente, recebem auxílio dos patrocinadores, comenta Lúcio.

Longe das principais notícias do esporte e do reconhecimento pelo trabalho feito, Gerson Knittel, pioneiro como guia, acredita que agora é o momento para se aposentar. Knittel iniciou como atleta na empresa onde trabalhava em 1986, com 21 anos. No ano seguinte, foi convidado para guiar atletas com deficiências visuais. A primeira para-atleta com quem Knittel treinou foi Ádria. Com ela teve sua maior alegria no esporte, quando a dupla conquistou dois ouros e uma prata nas Paraolimpiadas de Sydney, em 2000. A maior decepção de Knittel foi nunca ter conseguido um ouro em Paraolimpíadas com Zezé. Ele sente que faltou alguma coisa, que poderiam ter chegado em primeiro lugar. “Ela tem muito talento”, completa.

*Matéria feita no primeiro semestre de 2009

segunda-feira, fevereiro 22, 2010

Jec campeão do turno

Melhor impossível. Apesar da agonia, o gol no final do jogo, que deu ao Jec o título do turno, foi um dos que mais me emocionou.

O Joinville precisava do empate, mas em uma bobeira, o lateral-direito Patrick, do Avaí, aos 13 minutos do segundo tempo, calou a torcida joinvilense. O silêncio não durou muito, a torcida voltou a cantar e continuou com esperança do título.

Mas demorou. Foram mais de 25 minutos de ansiedade, quando aos 48 minutos e 50 segundos do segundo tempo (o jogo iria até os 49), Charles cruzou para área, Lima não conseguiu dominar e o zagueiro avaiano chutou para cima. Quando a bola estava quase tocando na grama, apareceu o pé direito de Ricardinho. Ele chutou, a bola ainda desviou no zagueiro e foi parar no fundo da rede. Se o dedinho do Ricardinho estive em uma posição diferente dentro da chuteira, essa bola não teria percorrido o mesmo caminho. Lance único, que fez com que os torcedores mais esquentados ouvissem de fora do estádio, após terem saído antes de acabar o jogo, o grito da torcida tricolor.

Os detalhes do gol só fui ver na tevê e ler no jornal. No momento do lance, não consegui pensar em nada. Vi a rede balançando e só quis pensar em comemorar. Não sabia quem abraçar, nem para onde berrar. Era muita emoção guardada. O choro foi inevitável. Não me perguntei como foi o gol e nem quem o fez. Só queria ouvir o grito da torcida jequena e perceber o silêncio da torcida avaiana.

No apito final, não consegui comemorar tanto: o gol já tinha tirado tudo que estava trancado na garganta. Joinville campeão do turno. Agora é esperar o adversário da final.

Jogadores comemoram gol do título. Foto: Fabrizio Motta/ANotícia

sábado, fevereiro 20, 2010

É amanhã: Jec x Avaí

Hoje estive na Arena para acompanhar o último treino do Jec antes do jogo contra o Avaí. O jogo, que será amanhã, às 17h, definirá o campeão do turno do Campeonato Catarinense e garantirá vaga na final do Estadual. A final do primeiro turno terá apenas um jogo. Como o Joinville teve melhor colocação na fase classificatória, jogará em casa.

Muita gente ficou decepcionada com o empate em cima do Metropolitano na semifinal, porém esse resultado garantiu o time na final do turno - sem contar que, mesmo com algumas quedas de rendimento, o elenco mostrou que tem qualidade para erguer a taça.

No treino de hoje, só um aquecimento e um rachão, para descontrair antes do jogo. Um dos melhores lances, para mim, foi o gol do goleiro Fabiano, que estava jogando na linha. O guarda-redes do tricolor chutou pouco antes da entrada da área e acertou caprichosamente a bola no ângulo do gol. No final, o time sem colete ganhou de 6 a 3 - resultado contestado por alguns, que disseram que o goleiro dos "com colete" levou apenas cinco gols.

O treino não mostrou apenas alegrias. No meio da brincadeira do rachão, o goleador Lima sentiu dores na costela, chamou o massageador e saiu de campo. Não consegui mais nenhuma informação sobre o caso, mas espero que não seja nada de mais e que ele faça a alegria da torcida tricolor no final da tarde de amanhã.


Final do turno do Catarinense - Joinville x Avaí
Local: Arena Joinville
Data: 21/02
Hora: 17h

segunda-feira, fevereiro 01, 2010

Agradecimento - Novo banner e quem sabe uma nova motivação

Agradecer a Mariana que se empenhou em fazer um novo banner pra mim. Depois de tanto eu encher o saco, ela terminou. Foda que ela já tá cobrando que eu volte a escrever no blog. Vamos ver se volta a vontade.

sábado, abril 25, 2009

Coletivo Contraparte ASPRESÉTXA:


Deixando um pouco de lado esses textos estranhos que escrevo, vim falar de RRRRRRRROCK (zoeira. ÓBVIO!). HAHAHAHAHA Seguinte, amanhã (26) na Associação de Moradores do bairro Itaum terá um show MANEIRÍSSIMO com cinco bandas. Começa às 2h30 da tarde e quem estiver afim de ir, é só comprar seu ingresso no local a cinco pila. Parece zoeira, né? Mas é a mais pura VERDADJA. A "Soci" fica na rua Monsenhor Gercino, 890, em frente à agência dos Correios e ao lado do postinho de saúde. No local também haverá venda de rango e material independente.

Um detalhe importante: não leve bebida alcoólica. A Associação só liberou o local com a condição de não haver esse tipo de bebida.

As bandas serão:

Through the Storm (Curitiba) http://www.myspace.com/xthroughthestormx
Eu Matei Pedro (Curitiba) http://www.myspace.com/eumateipedro
Teu Pai Já Sabe? (Curitiba) http://www.myspace.com/teupaijasabe
Black Sea (Curitiba) http://www.myspace.com/blackseaband
Brutal Sickness (Joinville)

terça-feira, abril 21, 2009

Os 90 minutos que decidiram o resto do ano

Amor é um só. Tá, tem gente que se diz poligâmico. Eu não acredito. Quer dizer, já tive duas paixões ao mesmo tempo, mas com naturalidade meu coração acabou se consumindo por uma só. E eu disse “com naturalidade”, porque paixão não se escolhe. Hoje sou monogâmico e meu coração tem três cores: preto, branco e vermelho. Minha paixão se chama Joinville Esporte Clube (Jec).


Ficar longe desse amor é complicado. Então logo vem o dia da decisão. O dia em que saberia se teria a sua companhia o resto do ano ou só o veria no final de 2009. Os 90 minutos que decidiriam meu humor do ano inteiro.


Para quem está por fora, explicarei. O Jec é uma das quatro forças de Santa Catarina, junto com Avaí, Criciúma e Figueirense. Nos últimos anos, o Joinville não tem demonstrado isso. Caiu da B para a C do brasileirão e ano passado ficou sem divisão. Inventaram uma série D do nacional e Santa Catarina teria direito a duas vagas. Para conseguir a primeira, o Jec precisava vencer a Copa SC do ano passado. Ficou em segundo, perdendo nos pênaltis para o Brusque. Brusque? É, Brusque.


A outra vaga viria do Catarinense. O Tricolor precisava ficar à frente dos clubes que queriam essa vaga: Atlético de Ibirama, Atlético Tubarão, Chapecoense e Metropolitano. Tarefa simples? Não sei. Pelos últimos resultados do Joinville nos estaduais, não se podia ter certeza disso. Começou o campeonato e o Jec demonstrou ser outro. Um time com garra e com muita habilidade. Trouxe confiança. Passou turno. Passou returno. Conseguimos a vaga para o quadrangular final junto com: Avaí, Criciúma e... Chapecoense.


Logo no primeiro jogo, em casa, empate com Criciúma. Segundo, derrota para o Avaí em Florianópolis. Terceiro, derrota para Chapecoense lá em Chapecó. Nesse momento, éramos o lanterna do quadrangular, com apenas um ponto em três jogos. Mas, havia mais três pela frente. Ganhamos da Chapecoense e Avaí em casa, faltava só mais um. O Joinville estava apenas um ponto atrás do time de Chapecó, que jogaria em Florianópolis. O Tricolor não dependia apenas de suas forças para se classificar. O Jec não podia perder para o Criciúma lá no Heriberto Hülse. Além do mais, a Chapecoense não poderia vencer o Avaí na Ressacada. De duas, uma: o Joinville ganhava e o time de Chapecó não vencia ou o Jec empatava e a Chapecoense teria que perder. Derrota do Joinville ou vitória da Chapecoense acabaria com o calendário do Tricolor para o ano inteiro.


Apesar de não ter mais chances, o Criciúma colocou seu time titular em campo. O Avaí, já classificado para final, não queria perder a invencibilidade de 15 meses em seu estádio. Seria um jogo complicado tanto para o Joinville quanto para Chapecoense.


Eu e meus amigos combinamos de assistir o jogo em uma lanchonete no bairro Itaum. Sabia que aqueles seriam os 90 minutos mais agoniantes do ano. Com dois minutos de jogo, gol de Zulu, do Criciúma. “Vamos ganhar”, pensei. Dez minutos depois, gol de Marcelo Silva para o Tricolor. Um a um. Em Florianópolis, continuava: Avaí 0 x 0 Chapecoense. Aos 21, o gol de Rogério Souza trouxe a alegria geral no local. Virada. Criciúma 1 x 2 Joinville. “Acaba, juiz”, comentário com 25 minutos de jogo.


Com o fim do primeiro tempo, ficamos do lado de fora da lanchonete conversando. Pelo celular, um senhor recebeu informações e nos comunicou: “Avaí tá jogando melhor”. O segundo tempo ia começar. Preferi assistir ali de fora, pela janela.


Começo do segundo tempo e logo no início a má notícia: “Em Florianópolis, a Chapecoense faz um a zero”. Puta que pariu, não deu tempo nem de sentar. Um minuto e já uma notícia dessas? Porra! Ainda tinha 45 minutos pela frente. Assisti até os 30 minutos, não conseguia mais ficar ali. Muita ansiedade. Fui dar uma volta. A cada casa que passava, tinha a esperança de ouvir a comemoração: “Aeeee porra, gol do Avaí”. Isso mesmo, estava torcendo por um time que tanto odeio. Quinze minutos andando sem rumo. Chegando à lanchonete, não precisei ouvir nada. As expressões dos que ali estavam já demonstrava tudo. Os resultados permaneciam os mesmo. “Faltam três minutos”, falou Guilherme. Tarde demais, a vitória do Joinville não trouxe a classificação. Chapecoense e Avaí na final. Chapecoense com calendário para o resto do ano. Meu Joinville? Ficará durante sete meses apenas no meu coração. Sete meses sem vê-lo.


Sim, isso me deixa triste. Na verdade, isso interfere significatimente no meu humor durante o resto do ano. Não ficarei completamente feliz sem ver o Joinville jogando. A maioria deve achar isso uma grande besteira. Todo esse sentimento. Toda essa paixão. Mas como disse, amor não se escolhe. Só entende isso, quem sente.


Já na casa do Nalvan, todos queriam esquecer o resultado, mas sempre surgia um desabafo: “Que merda esse gol da Chapecoense”. E logo vinha a resposta: “Porra, tinha que lembrar, né?”. E essa mudança de humor, de alegria e tristeza, durou a noite toda, o dia seguinte, hoje e, certamente, continuará até o momento que eu estiver no estádio, vendo o Tricolor jogando e a torcida cantando: “Meu coração é preto, branco e vermelho...”


quinta-feira, abril 16, 2009

O dia de aniversário do Restaurante Popular

Terça-feira (14 de abril) houve a cerimônia do aniversário de um ano do Restaurante Popular, que cobra R$ 1,00 por almoço. A abertura do local foi às 11 horas, como de costume. Cheguei com o compromisso de fazer uma matéria. Logo de início, analisei as perguntas feitas pelos repórteres ao prefeito Carlito Merss, que estava no local com outras autoridades. Depois, fui para a fila.

Lá, enquanto discutia com Marcus, amigo de faculdade, sobre a necessidade, ou não, de conversar com o Carlito sobre o restaurante, observava o movimento do local. Tinha gente com uniforme de empresa, desempregados, moradores de rua, estudantes, famílias e, fora da fila, o grupo: prefeito e seus acompanhantes. Decidi não tirar meu bloco da mochila. Deixei que as informações viessem de forma natural.

O assunto na fila, basicamente, era o mesmo: o aniversário do restaurante. Uma senhora, com aparência de uns 60 anos, me falou: “É a quarta vez que venho aqui”. A cada passo que dava, a ansiedade de comer aumentava. Atrás da parede de vidro, já via-se o prato do dia. “Hoje tem bolo”, alguém, pouco à frente, comentou. Chegando na entrada, abri a carteira e perguntei: “É um real tudo? Até com suco?”. A moça do caixa confirmou. Nisso, outra senhora na fila iniciou um diálogo:

- Primeira vez aqui?

- Sim! - respondi.

- Eu venho desde que isso abriu. Tenho dois filhos, mas eles vieram poucas vezes. Eles têm preguiça de ficar na fila, então almoçam em outro restaurante. Mas eu não, venho aqui todo dia.

- Mas tu vem de ônibus todo dia? Porque aí não compensa, né? - outra moça comentou.

- Não, trabalho de diarista aqui perto. Venho de bicicleta.

Nessa conversa, passamos pelo corredor de entrada, onde tem um lavabo.

Confrontando com os dados que apontam 10 minutos como tempo médio de espera, peguei o prato após 35 minutos na fila.

Um pão francês, arroz, feijão, alface, cenoura, suco e dois guardanapos, foi o que levei comigo para a mesa. Ainda, para quem quisesse, tinha um pedaço de frango, macarrão e bolo, como sobremesa. Já à mesa, o assunto principal era a presença do prefeito Carlito Merss. Olhei para fora, através do vidro, e vi as pessoas nos observando, exatamente como eu fazia, quando estava naquela situação de espera. Ainda fora da fila, o prefeito conversava com repórteres e amigos.

O almoço estava gostoso. O ambiente estava ótimo. Na mesa, algumas frases eram citadas para puxar assunto. Voltava o silêncio. Logo, mais comentários. O diálogo sempre era sobre o restaurante. Enquanto um questionava a perda de qualidade da comida, outro criticava a demora para conseguir almoçar. Num certo momento, um senhor de idade comentou: “Olha o prefeito ali na fila”. Olhei. Ele já havia passado pela catraca de entrada. Observei pessoas que haviam me chamado a atenção na fila, e elas ainda estavam lá, antes da catraca. “Furou fila”, pensei. “Alguém pode ter guardado lugar para ele, mesmo assim, furou”, conclui.

A presença de Carlito, na mesa ao lado, alterou o clima natural do ambiente. Na verdade, não sei como é o clima normalmente, mas a data festiva e a presença do prefeito, certamente modificaram a rotina do restaurante.

Levantei-me. Levei a bandeja para o lugar. Separei a louça, como pedido. Joguei no lixo dos copos, o copo, e no de guardanapo, os guardanapos. Olhei atentamente o local. A grande maioria são pessoas que realmente precisam desse serviço. São humildes, simples, que muitas vezes saem de casa pela economia que terão almoçando ali. Outros vêm do trabalho ou de escolas próximas.

Em média, são oferecidas 725 refeições por dia no Restaurante Popular. A cada prato, a prefeitura subsidia com R$ 2,50. A capacidade do local é de 100 pessoas, porém, apesar da fila, muitos lugares ficam vagos. A demora ocorre ao servir os alimentos. Apenas colocar mais mesas e lugares, não diminuiria o tempo de espera. É preciso organizar uma forma de servir ao público que não dependa apenas de uma fila. Colocar outras bandejas de alimentos, bifurcando a fila após a entrada, e aumentar a capacidade de lugares, faria com que o atendimento fosse mais ágil.

Lá fora, a espera estava maior. Algumas pessoas que já haviam almoçado, retornaram à fila para comer novamente. Os satisfeitos compravam picolé em frente ao restaurante com o dinheiro economizado. Eu preferi deitar embaixo de uma árvore e descansar.



Obs: Essa matéria foi feita para a revista eletrônica do Bom Jesus/Ielusc (Revi).